terça-feira, 26 de novembro de 2013

MAS QUE GRANDE TRISTEZA!





"QUEM QUER SER MILIONÁRIO?"
fig. 1) A Sara acertando a resposta.
fig. 2) A Manela a explicar como (não) se lê o Pi.
fig. 3) A Sara ainda confiante.
fig. 4) A Sara desconfiante.

Que grande tristeza, ou a VÃ SORTE de quem apenas quer passar um bocadito do serão, sossegado, sem grandes alaridos, sem drama nem despropositadas gargalhadas. Mas isso era o que eu procurava, quando, após o costumeiro zapping, resolvi estacionar o comando na RTP 1.

Hoje em dia, em termos de espetáculos e informação, há tanta matéria e conteúdos que um tipo nem sabe bem o que escolher, nem por onde começar.
Dantes, em épocas idas, pelo menos lá pelas bandas do Cartaxo, a rapaziada, sempre que achava piada a um qualquer assunto mais rocambolesco e, por via disso, arranjar motivo para pôr-se a gozar com determinado colega, costumava dizer: - "Isto ainda é melhor do que ir ao Cinema!"
Pois era. Mas quando um o fulano proferia aquela frase, estaria certamente a referir-se a um tipo de filme mais ou menos cómico, uma fita para rir. Até porque as fitas que só traziam drama e desgraça, eram mais do agrado das mulheres mais maduras ou das de idade avançada. Elas, como que por masoquismo, gostavam de professar uma cultura de carpidura e convulsões; impregnar a sua alma com o "drama da coxinha" em vez da cultivar o riso e a destemperada e sonora gargalhada, como a rapaziada nova fazia. Cow-boys e comédia desbragada era connosco. Enfim! Eram outros tempos.
Como já disse no início, a malta, de tanta oferta, nem sabe bem o que escolher para ver, ouvir e ler. Não há fome que não dê em fartura, mas há fartura e há fartura. E por falar em fome e em fartura, não se pense que o tema que aqui me traz hoje, tem alguma coisa a ver com aquelas guloseimas em forma de rosca, cor de ouro e pejadas de açúcar, que se vendem nas autocaravanas, aí por essas feiras fora. Não. Aqui o assunto, que nada tem a ver com comezainas, tem duas vertentes: uma cómica e outra dramática. Assim como uma espécie de dois em um. E passo a relatar.
Ontem, à noite, estava eu fazer o habitual e incomodativo (só para terceiros) zapping via TV, quando, ao passar pela "nossa" RTP, me deparei com o Concurso em título. Não é que eu seja um assíduo e fiel espetador daquele passatempo, mas, já que por ali estava, e com a mão na massa, por que não ver "o fundo à panela" e seguir o diálogo das meninas? E assim fiz: por ali parei, por lá fiquei.
A primeira concorrente, que, pelos vistos, já sobrara da 1ª parte (que eles dizem ser da véspera), era uma tal de Vânia, professora do Ensino Básico. E estando a senhora habituada ao Básico, também não admirava que, parte das vezes, ela se situasse numa linha de atuação dentro de básicos conhecimentos. Pelo menos, assim, estaria a ter um fiel comportamento a tal nível educacional. Depois de algumas falhas e periclitantes respostas, lá veio a pergunta com o diabo das cagarras. Então a senhora não sabia que o Cavaco Silva esteve, aqui há pouco tempo, com uma cagarra entre mãos? E não sabia a dita senhora, que o Cavaco tinha andado aos trambolhões, escarpas abaixo e, depois, devido ao cansaço, até pernoitou na Selvagem Grande? Grande falha de memória (ou de conhecimento) a sua, professora Vânia. Sua e a do seu pseudoajudante, porque este, com menor pressão, por não estar a dar a cara na TV, também não se saiu lá muito bem. Enfim, um fiascozito. Mas esta 1ª parte era apenas a ponta do iceberg da sessão, para aguçar o apetite aos telespectadores, porque o melhor ainda estaria para vir.
E, com o chumbo da professora Vânia, veio uma nova concorrente. Esta, em termos de rapidez de dedo, nada ficava a dever à primeira. Mas ela não era uma concorrente qualquer. Porque, além de ser um pedaço mais nova que a primeira, ainda se chamava Sara Chaves, vinha de Sintra e ria por tudo e por nada. Mas isso não tinha mal; se ela tanto sorria, era porque estava contente. E contente também deve ter ficado a malta, quando ela apresentou o seu currículo. Sim, porque os portugueses não são invejosos. Gente com tais performances e anseios, não são olhadas como "personas non gratas", mas antes com um misto de vénia e subserviência. Assim a menina viesse a dar provas de que o merecia.
A Sara, além de se ter apresentado com os tais rasgados sorrisos e de nariz um tanto empinado, boa prosápia, também disse que, além de ser licenciada em Gestão, tinha uma pós-graduação em Marketing e Comunicação. E, não se ficando por aqui, ainda disse esperar entrar, num destes dias, no Mestrado. Para começo de concurso não estava mal. Até porque todos sabemos quão difícil foi a certos políticos atingirem certos certificados académicos (vulgo canudos), tendo alguns deles conseguido a folha, se não à força, ao menos através de meios bastante obscuros.
Mas a Sara, evidenciando descontração, mostrava-se pronta a entrar na liça. E lá saiu a primeira pergunta (ver fig. 1).
Nesta questão, a Sara nem pestanejou. Acertou logo à primeira. Porém, para estragar tal desempenho, tinha que ser a RTP a dar duas das suas já habituais barracadas.
Tratava-se do valor de Pi, que, como toda a gente sabe (e até a Sara sabia), é um número irracional, cujo valor abreviado é de 3,14159265... e por aí fora, até ao infinito. De facto, o tipo que fez a legenda escreveu 3, 1415. Isto está errado. Se ele queria abreviar no 4º algarismo, então tinha que escrever 3, 1416... Como facilmente se compreende, o arredondamento do 5 é por excesso e não por defeito, pois que é seguido do 9. A segunda calinada foi da Manela. Mas como é ela quem dá a cara pela RTP... A fulana, no sentido de ensinar à concorrente como se lia o número, disparou o seguinte despautério: 3,1415... três, mil quatrocentos e quinze. Seja, três, vírgula, mil quatrocentos e quinze. Onde chegou a ignorância, Dios Mio!
Mas a sessão ainda agora ia a meio. Às tantas, apareceu uma pergunta do tipo lana caprina, que era mais ou menos assim:
Ao tempo do sismo de 1755, em Lisboa, por alturas do Marquês de Pombal, quem era o rei?
A-D. Sancho II; B-D. José I; C-D. Afonso IV; D-D. Carlos I
Mas a Sara, tendo excluído de imediato o D. Carlos, porque, segundo disse, (e para gáudio da Manela), esse rei já tinha morrido, não foi capaz de engrenar na resposta. Mas, segundo ela, isso não constituía qualquer problema, já que, com a ajuda da sua amiga Carla, que a Sandra apelidava de SABICHONA, ia ser canja. A Manela telefonou; a Sara perguntou, mas a Carla é que não respondeu. Afinal, a SABICHONA não sabia. Nisto, recorre-se à ajuda do Público. Este, contrariamente ao que tem sido hábito - dizem - lá acertou. Era mesmo D. José I.
Disse então a Sara que, antes, tivera um feeling que lhe soprava aos ouvidos, falando do D. José, mas, pelos vistos, não passou de feeling nem de sopro.
Ao cair do pano, cai uma pergunta que questionava qual a capital da Eslováquia. Então, a nossa Sara, que pouco tardou na resposta, atirou com esta: Budapeste!
Com franqueza. Se fosse a capital do Laos, do Bahrein ou Burkina Fasso, ainda vá que não vá, agora a de um país europeu, da C.E?
Depois do estrondoso falhanço, disse ela: - "Eu devia ter pensado 2 vezes!" E digo eu: pois é, mas estas coisas esquecem muito a quem não sabe, não é Sara?
Tenho a certeza de que, a esta hora, estarão os putos dos 3º e 4º anos a pedir aos pais para que os deixem participar no "Quem Quer Ser Milionário". Eles, lá no seu conceito, acham que fariam bem melhor do que a eminente licenciada, pós-graduada e, não tarda, MESTRE.
São estes casos que dão azo a que o Crato venha exigir exames aos professores e, qualquer dia, a todos os licenciados, exceto os seus colegas com Cursos de Vão de Escada. Esses, enquanto o esquema durar, estarão sempre a salvo das investidas do ministro.
Cultiva-te Sara! Cultiva-te rapariga. Mais aprendizagem e menos risota.
Quero com tudo isto dizer, que esta sessão, a avaliar pelas airosas entradas em cena das concorrentes (especialmente da Sara), prometia muito. Como esta ria e ria, eu, que não sou amorfo, por efeito de contágio, também ria. O espetáculo estava a ser fixe. Mal tinha começado a saga e já eu ria a com alguma galhofa; depois, numa fase mais adiantada, dei por mim a rir a bandeiras despregadas. Perto do final, as lágrimas que eu vertia, já não eram providas de gozo, mas de tristeza. Ainda tentei conter-me, mas não fui capaz. E se tentei, talvez fosse pelo ditado que se diz, que "um homem não chora".
Acabou por ser um espetáculo, dentro do espetáculo, que foram a Vânia (menos) e a Sara (mais, muito mais). Se me pedissem para o classificar, eu diria que se tratou de misto de comédia, primeiro, e drama, depois. Ao contrário do que quase sempre acontece no Cinema, em que tudo acaba bem para o rapaz, aqui o final foi dramático. Isto, tanto para as duas raparigas, como para aqueles que, tal como eu, se sujeitaram a este vexame noturno ofertado pela estação televisiva que é de todos nós. Pelo menos daqueles que, mesmo com drama, ainda vão pagando os impostos.
Mas não se dramatize. Esperemos por melhores sessões, caso os donos da RTP o queiram.